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Resenha #3 | Marie Curie: uma vida


A lombada do livro Marie Curie se destacando em meio aos outros da estante.
Foto: Lucas Wasem

A história de vida da maior cientista da humanidade, Marie Curie. O livro Marie Curie: uma vida, de 1995, foi escrito por Susan Quinn e posteriormente publicado pela Scipione Cultural em 1997 no Brasil. A biografia baseia-se em anotações de Marie, seus filhos e amigos, bem como em notícias da época, biografias e estudos previamente publicados, além de uma vasta pesquisa realizada pela escritora. São 526 páginas que relatam todas as etapas da vida de Marie Curie, separadas em 19 capítulos que contam do nascimento à herança deixada pela cientista polonesa.


Maria Skolodowska nasceu na Polônia em 1867, filha de cronistas e ativistas pela liberdade do país onde viviam, à época dominado pelo Império Russo. Desde nova, Maria e seus irmãos receberam uma educação focada na ciência, com um árduo esforço de sempre levar um ensino de qualidade apesar das dificuldades políticas e financeiras que envolviam a família.


Com 23 anos e depois de trabalhar para juntar dinheiro, Maria partiu rumo à França para estudar na Sorbonne, universidade tradicional e renomada onde conheceu o grande amor de sua vida, Pierre Curie. Essa união gerou frutos. Na vida pessoal: um casamento feliz e duas filhas, Eve e Irene. Na vida profissional: estudos que revolucionaram os campos da química e da física, com a descoberta de dois novos elementos químicos, o rádio e o polônio, nome dado em homenagem ao país natal de Marie. Estas descobertas criaram uma nova área de estudo na ciência, a física nuclear — rendendo ao casal e ao parceiro de pesquisa, Antoine-Henri Becquerel, o Prêmio Nobel de Física, sendo Marie a primeira mulher a conquistá-lo.


Mas essa união teve um final trágico num dia cinzento e nebuloso em Paris. Pierre, já desgastado e doente devido à exposição à radioatividade, morreu atropelado por uma carruagem, deixando Marie Curie e suas filhas. Essa perda abalou muito Marie, que já sentia os efeitos da radioatividade no seu corpo. Mesmo assim, Marie Curie persistiu nos estudos que a levaram a ganhar seu segundo Nobel, agora relacionando o tratamento do câncer à radioatividade.


Porém todos os feitos de Marie Curie e sua vanguarda em tantas áreas confrontavam os princípios secularizados e ultrapassados da sociedade da Belle Époque, já decadente na primeira década do século XX, mas que queria manter suas tradições, atacando a todos que ousassem desrespeitá-las. Com toda a exposição e sucesso, Marie Curie se tornou o alvo favorito de perseguição por jornais e membros da alta sociedade parisiense. O ataque começou quando Marie candidatou-se para a Academia de Ciências da França, até então só ocupada por homens — local que era de seu direito participar após toda a sua contribuição para a ciência. Os jornais conservadores começaram uma campanha para desmerecer o trabalho de Marie, colocando-a como coadjuvante da pesquisa que fez com seu marido, atacando sua nacionalidade e o fato de ser uma mulher em um lugar dominado por homens. Isso impediu-a de entrar na Academia e fez dela a vítima favorita da sociedade tradicional.


Uma mulher, em preto e branco, olha séria para a câmera.
Marie Curie, por volta de 1920 / Foto: Henri Manuel/Domínio público

A perda do marido e a constante perseguição, somadas aos problemas de saúde devido à constante exposição à radioatividade, geraram uma tristeza profunda em Marie, que encontrou apoio em Paul Langevin, amigo e colega de pesquisa. A amizade e o carinho entre eles resultaram em amor, confidenciado nas cartas trocadas por eles. Essas cartas, no entanto, foram descobertas por Jeanne Langevin, esposa de Paul, e divulgadas pela imprensa, causando um escândalo na época — que terminou em um acordo entre Jeanne e seu marido, encerrando assim o relacionamento entre Paul e Marie. Isso aumentou o colapso físico e mental que levou Marie a um tratamento longo e doloroso.


Mas chegou a Primeira Guerra Mundial e Marie estava de volta, ajudando a formar dezenas de equipes de atendimento que utilizavam o radiógrafo, equipamento que faz imagens de Raio X. Após a guerra, a sociedade da Belle Époque perdeu importância, e Marie Curie começou a receber o devido reconhecimento. Marie passou os últimos anos de vida junto de suas filhas, estudando e palestrando em vários países, até morrer, em 1934, por decorrência de diversas complicações geradas pela radiação.


É inevitável e necessário reconhecer a importância que Marie Curie tem em diversos aspectos:

  • O primeiro, em crescer um país dominado e reprimido, onde o sentimento polonês era proibido e as dificuldades de livre expressão impediam o crescimento profissional de Marie;

  • A ida para a França, um país cosmopolita, e o enfrentamento do desafio de estudar em uma área dominada por homens, na qual a sua capacidade era questionada a todo momento;

  • A criação de duas filhas sem deixar de dedicar-se ao trabalho, visão revolucionária para uma sociedade que resumia a participação da mulher à administração do lar;

  • O trabalho magnífico realizado por ela e seu marido para a descoberta de dois elementos químicos e pela revolução na radioatividade, unindo teorias e utilizando métodos científicos rígidos, trabalhando a parte química e física dos elementos descobertos;

  • A constante luta para assumir postos de destaque até então só ocupados por homens, como a Academia, mostra que Marie nunca deixou de persistir em receber seu devido reconhecimento, mesmo que isso resultasse em atritos com alas conservadoras da sociedade. Marie nunca deixou de lutar pelo que amava — a ciência, a Polônia e sua família.


Marie Curie dentro de um caminhão. Foto em preto e branco.
Marie Curie em uma unidade móvel de raios X do Hospital Militar, por volta de 1915 / Foto: Autor desconhecido/Domínio público

Marie Curie é até hoje um símbolo de enfrentamento das dificuldades, de luta pela liberdade feminina, dedicação, inteligência e amor. A autora faz uma reflexão e análise muito aprofundada da vida de Marie, tentando reduzir os mitos e visões mais simplistas de uma pessoa complexa, que viveu em uma época de ebulição científica e social. Essa complexidade de Marie merece a quantidade de biografias escritas sobre ela — inclusive a mais famosa, escrita por sua filha Eve Curie e publicada em 2001. Susan apresenta um livro rico em detalhes, que utiliza dezenas de cartas e relatos de Marie encontrados apenas na década de 90; assim, consegue levar ao leitor mais da Marie humana, menos conhecida do público. No meio do livro, Susan adicionou fotos relacionadas à Marie; são dezenas de imagens que ajudam ainda mais o leitor a criar o ambiente e entrar na vida de Marie Curie.


Apesar de ser raro encontrar este livro nas livrarias e sebos do Brasil, a leitura sobre a vida de Marie Curie é muito importante, pois trata-se de uma pessoa que quebrou paradigmas em diversas áreas e que tem uma importância enorme no século XX. Por existirem outras biografias mais acessíveis sobre ela, recomendo muito descobrir mais sobre a pessoa fantástica que foi Maria Skolodowska, mais conhecida como Marie Curie.


A escritora Susan Quinn nasceu em 1940 nos Estados Unidos e se formou pela Oberlin College. Começou sua carreira em Cleveland, trabalhando em um jornal enquanto estudava para ser atriz. Na década de 70, se mudou para Boston, onde trabalhou no The Real Paper e no Boston Magazine. Desde a década de 80, Susan escreve artigos sobre ciência, política e sociedade em vários jornais e revistas, como The New York Times Magazine, Athantic Monthly e MS Magazine. O livro Marie Curie: A Life (em português: Marie Curie: uma vida), foi seu grande sucesso, traduzido para oito línguas. Susan também escreveu outros livros de não ficção como: Eleanor and Hick: The Love Affair That Shaped a First Lady e Human Trials: Scientists, Investors and Patients in the Quest for a Cure, disponíveis apenas no original, em inglês.

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